Blanck Mass - Animated Violence Mild (Sacred Bones)
No seu novo trabalho, Benjamin John Power perde alguma pujança na perfidez da sua sonoridade. Como resultado, surge Animated Violence Mild, o álbum mais melódico e coeso do projecto até à data. A violência e o experimentalismo continuam bem presentes, mas de uma forma bem mais doseada e premeditada, que se traduz numa fluidez perfeita nas músicas. Bons exemplos, e autênticas pérolas musicais, são “House vs. House” e “Love is a Parasite”. Animated Violence Mild é um dos melhores e mais excitantes álbuns de eletrónica que ouvimos nos últimos tempos. - JR
Ełłe - ... (Dog Knights/Zegema Beach)
O atual screamo revival encontra-se bem preenchido por uma vaga de ideias refrescantes, coesas e modernas. Com membros de Loma Prieta e Beau Navire, os americanos Ełłe são sem dúvida um dos elos mais fortes. O forte arranque de carreira esteve à vista com o seu álbum de estreia She, mas é com a chegada das reticências (sim, o álbum chama-se mesmo “…”) que fica sublinhado o nome a não esquecer no screamo de 2019. O segundo esforço da banda vê a própria cada vez mais confortável no mitigante e ensurdecedor eco da melodia em momentos de caos, urgência e emoção à flor da pele. Preservando simultaneamente a beleza da funcional melodia e a abaladora distorção tão reminiscente de uns Orchid ou Daïtro, não há momento algum em … que não seja memorável. - JMA
Fawn Limbs - Harm Remission (Sludgelord)
A beleza deste novo projeto é algo realmente indescritível. Para quem consegue apreciar a real barafunda do grind e a tenacidade técnica do mathcore, o disco de estreia dos Fawn Limbs, Harm Remission, é capaz de ser o sonho molhado que encontra o monstruoso equilíbrio entre esses dois mundos. Longe de polarizante, é impossível ficar indiferente a estes 25 minutos de blast beats, dissonância, poliritmos, estridentes berros, pedal duplo e sucessivos ataques de epilepsia sob forma de distorção, peso e glitches acrobáticos. - JMA
HIDE - Hell is Here (Dais)
Heather Gabel e Seth Sher compõem HIDE. Desde 2014, estes dois têm vindo a produzir post-industrial altamente rítmico e sísmico, fazendo-se acompanhar não só por comentário sociopolítico, como por uma sonoridade revigorada por sampling e field recording. Hell is Here é um enorme step-up no projeto. Com a ajuda de uma produção cristalina e robusta, o quarto disco de Heather e Seth mostra-se denso, massivo, dançável e reverberante, expansivo e cativante, e ao mesmo tempo longe de uma afirmação feliz. Como uma lâmina a despir o corpo das suas vísceras, HIDE recusa-se esconder do mundo real, e o primeiro a ser confrontado é o ouvinte. - JMA
Lana Del Rey - Normal Fucking Rockwell! (Polydor)
Deu-se a separação com as experiências de pop-para-vender descontextualizadas de Lana Del Rey, entrando agora no soft rock que lhe assenta decisivamente bem. Aparece de som maduro, ativado pelo piano e pela guitarra acústica limpa, pelas guitarras elétricas extensas com um papel de maior estima, a abrir espaço para o ambiente erotizante dos boémios 60 e 70 – época que elogia o timbre mélico e anacrónico de Lana. Norman Fucking Rockwell! desdobra-se numa coleção intensa de baladas folksy, tornando-o no álbum mais espontaneamente fluído desde Ultraviolence. - BF
Meatwound – Culero (Financial Ruin/Pax Aeternum)
O terceiro trabalho deste quarteto de Tampa, Flórida é apenas mais uma lição de como é possível manter um som atualizado, ao mesmo tempo que se presta homenagem a uma mão bem cheia de influências old school. Percussão caótica e uma monumental dose de baixo aliam-se à dupla pujança vocal, tornando-se ingredientes chave para deixar qualquer fã de hardcore ou sludge “nas cordas”. A dinâmica entre temas e umas quantas passagens mais hipnóticas, onde confortavelmente nos cruzamos com o drone e o psych, lixam-nos qualquer tipo de rótulo. Laivos de Converge e Godflesh, derramam-se no limiar do desconforto, tal como se quer. Repeat. - AT
Oh Sees – Face Stabber (Castle Face)
Face Stabber é a recuperação da vitalidade após os anteriores, mais entorpecidos, Grave Blockers e Thee Hounds of Foggy Notion. Aqui vai o funky, gravemente absurdo, estapafurdiamente bem-disposto Face Stabber. O fuzz estabiliza a loucura da fritura e a atrocidade é objeto de humor. A bateria de jazz, o sintetizador espumante e as guitarras alucinogénicas que seguem para todo o lado em direção ao lugar certo, são implacáveis ao longo de mais de uma hora de um disco concluído com uma faixa de 21 minutos. É o álbum de Oh Sees em que as palavras de um homem louco aparentemente descoordenado e desorientado fazem todo o sentido. - BF
Pijn & Conjurer – Curse These Metal Hands (Holy Roar)
A história remonta ao ArcTanGent de 2018. Hoje, para além de companheiros de editora, estes nomes são já reconhecidos como dois dos mais recentes porta-estandartes no que diz respeito ao post-metal britânico. Não um split, mas uma acertada colaboração, acaba então por se revelar numa verdadeira jornada sónica, produto da mais bela combinação entre as atmosféricas paisagens do post-rock e o turbulento groove do sludge. Uma coesa jam-based approach, onde transições eletro-acústicas e um forte contraste entre vozes representam apenas a ponta do iceberg. Nesta misturadora, encontramos Baroness, Isis e até Inter Arma. Uma meia hora que sabe tão bem, que nos deixa a querer por mais. - AT
Portrayal of Guilt – Suffering is a Gift (Closed Casket)
Desde o seu disco de estreia Let Pain Be Your Guide, P.O.G. tem vindo a crescer exponencialmente com digressões ao lado de Wiegedood, Skeletonwitch, Harm’s Way, Jesus Piece e muito mais. Felizmente, meses antes do seu retorno à Europa, com passagem pelo nosso Amplifest, chega o mais recente EP Suffering is a Gift para efetuar uma feroz atualização na moldura sonora da banda. A contar com um bruto aumento de agressividade em momentos de descarga, uma condensação sufocante de peso e uma maior incidência de elementos noise de início ao fim, são estes alguns dos pontos de foco que estão a maturar Portrayal Of Guilt num dos nomes mais pesados no screamo atual. - JMA
Regional Justice Center - Institution (Triple B)
Após a encarceração do seu irmão mais novo, Ian Shelton criou R.J.C. de forma a proclamar muitas das falhas do sistema judicial americano. Um ano após a aclamada estreia World of Inconvenience, o trio volta em carga com o EP Institution, através da americana Triple B. Dentro destes compactos e imersivos cinco minutos de puro e duro powerviolence, pulverizador e destemido, somos confrontados pela real ruptura do indivíduo num sistema construído para o desmantelar. - JMA
The Black Wizards - Reflections (Kozmik Artifactz/Raging Planet)
É com a euforia desalmadamente fortificante do deslocamento para uma época idealizada que The Black Wizards garantem que vivemos um presente igualmente fluorescente. A voz de Joana Brito consegue ter tanto de entorpecente como de sufocante, em exclamações de insolência que lhe são espontâneas. Em “Symphony of the Irony Sympathy”, encontramo-la em pico de robustez instigadora de si própria, e em “Starlight” temo-la quente e circundante. A guitarra fixa a reverberações de distensão e a bateria com ritmos hiperativos apoiam-se nos colapsos de energia. O balanço dos preenchimentos, simples e de bom gosto, solta fidelidade psicadélica de intrepidez e alma. Reflections torna-se assim numa paragem obrigatória. - BF
Tool - Fear Inoculum (RCA)
Treze anos de espera. Número de premonição, misticismo, mau olhado, azar e/ou sorte. O quinto álbum do quarteto de L.A. é tudo o que prometia ser, e mais. A fome de Tool é finalmente apaziguada com Fear Inoculum e o prato vem repleto de mensagens sublimes de um grupo que se questiona se ainda tem lugar na ribalta do metal: “A warrior / Struggling / To remain / Consequential”. Resposta curta: sem dúvida que sim. Mais do que um sucessor natural de 10,000 Days, o trabalho, com mais de 80 minutos, apresenta cada um dos elementos na sua melhor forma. Um Keenan acossado na praça dos media que se vinga com uma atuação vocal imaculada, um Jones com o melhor trabalho de guitarra da sua carreira (“7empest”), um Carey (ainda mais) monstruoso (“Chocolate Chip Trip”) e um Chancellor no topo da cadeia alimentar dos baixistas do género mais duro. Se mais tempo de espera é sinónimo de qualidade, então falemos daqui a outra década. - PS
Artigo escrito por: Andreia Teixeira (AT), Beatriz Fontes (BF), João "Mislow" Almeida (JMA), João Rocha (JR) e Pedro Sarmento (PS).